sábado, 15 de setembro de 2012

Tibet Silenciado - Parte 2


A maior característica tibetana, porém, era a religiosidade. O budismo foi introduzido no país no século7, quando o rei Songtsen Gampo se casou com duas mulheres budistas - uma da China e outra do Nepal. Ao longo de centenas de anos, consolidou-se o Budismo da corrente indiana Mahayana, originada no século 2, que enfatiza a compaixão, a meditação e a intelectualização das comunidades monásticas.

Os estadistas e líderes espirituais do país - os lamas - são considerados encarnações de divindades. Tenzin Gyatso, o atual Dalai Lama, seria uma encarnação de Avalokitesvara, o Buda da compaixão.

Dos nômades das montanhas à maior autoridade do país, passando pelo agricultor e o funcionário do governo, o Budismo estava presente no cotidiano de cada tibetano, nas estátuas e nos pequenos altares que todos possuíam. A vida monástica era a forma pela qual a civilização tibetana se delineava. Os monastérios, os gompas, eram os lugares onde se aprendiam arte, literatura e medicina.

Calcula-se que, na época da invasão 10% da população total do Tibete fosse de monges e monjas. Eles detinham além do poder religioso, o poder político. O chefe de Estado era o Dalai Lama, seguindo pelo Panchen Lama e pelo Karmapa Lama, e abaixo deles estavam um gabinete e um conselho formados por clérigos e por nobres leigos.


O Massacre

Naquele dia de outubro quando a china entrou no Tibete, o Exército de Libertação do Povo tinha 40 mil chineses, e era quase cinco vezes maior do que o tibetano, composto por 8.500 homens. Além do número pequeno de combatentes, a população tibetana seguia a crença budista da não-violência, ou seja, da convivência pacífica. Robert Thurman, em seu livro Revolução Interior, explica que os tibetanos valorizavam o desenvolvimento espiritual dos indivíduos acima da conquista de territórios ou poder e, por isso, para eles suas vidas tornavam-se as posses mais preciosas.

A não-violência seria um resultado disso e, por conta desse princípio, os tibetanos não possuíam um exército numeroso ou preparado. Mesmo assim, os militares do Tibete enfrentaram os chineses.

Eles tiveram a força para lutar apesar da religão. O Budismo diz que você pode se defender mas não atacar. A população não ouviu os líderes budistas que disseram "não lutem". Quando os chineses invadiram o Tibete, os tibetanos sentiram muita raiva. Eles queriam lutar para proteger suas famílias e país, porque tinham um exército pequeno e ninguém lhes havia oferecido ajuda. Em poucos dias, o pequeno contingente tibetano havia sido aniquilado.

Com o avanço do exército chinês e sem nenhum auxílio internacional (a Inglaterra, os Estados Unidos e a Índia havia negado ajuda), o Tibete se via encurralado. Em novembro de 1950 o 14º Dalai Lama, que tinha 16 anos de idade e era tutelado por um regente, assumiu os poderes espirituais e temporais do Tibete como chefe de Estado. Mas a situação se agravava e, em maio de 1951, uma delegação do governo tibetano foi coagida a assinar o "Acordo dos 17 Pontos", que dava à China soberania sobre o Tibete. Segundo o documento, os chineses aceitariam os costumes tibetanos e ajudariam no desenvolvimento econômico e educacional do país.

O Dalai Lama refugiara-se em Yatung, na fronteira indiana, porque temia ser assassinado se houvesse uma invasão chinesa à capital. "Como um homem jovem e fisicamenete capacitado, meu instinto era compartilhar todos os riscos que muita gente estava correndo", conta ele em sua autobiografia, "mas para os tibetanos a pessoa do Dalai Lama é uma preciosidade suprema e, sempre que surgia o conflito, eu tinha que permitir que meu povo cuidasse de mim mais do que mesmo jamais pensasse em fazer".

Mas a China não cuimpriu seu lado do acordo e, além disso, exigiu que o Dalai Lama voltasse a Lhasa, alegando que o general chinês designado representante da China no Tibete não havia sido bem recebido. Em setembro de 1951, 3 mil soldados chineses entraram na capital. em 1954, eram 222 mil membros do exército chinês no Tibete. O Dalai Lama foi convidado a ir a Pequim, onde passou cerca de um ano e pôde conhecer Mao Tsé-tung. O presidente chinês propôs, então, a criação do Comitê Preparatório para a Região Autônoma do Tibete, que seria presidido pelo Dalai Lama e teria como vices o Panchen Lama e o funcionário chinês.

Quando o Dalai Lama voltou ao Tibete, no entanto, o Comitê se revelou mais um instrumento do controle chinês do que uma tentativa de estabelecer um governo conjunto. A repressão chinesa crescia e, no leste, esboçou-se uma guerrilha de resistência, que não obteve sucesso significativo. Pessoas das províncias de Kham e Amdo, na parte oriental do país, fugiram de suas terras e rumaram a Lhasa, onde montaram acampamento. Na capital, milhares de tibetanos protestavam contra a invasão chinesa.

Dez mil pessoas reuniram-se em volta do Norbulingka, o palácio de verão do Dalai Lama, para proteger Sua Santidade.

Em 17 de março de 1959, granadas foram atiradas contra o palácio. Naquela mesma noite, vestindo um surrado uniforme de soldado e carregando uma arma, o Dalai Lama deixou Lhasa. Pouco depois, o palácio foi bombardeado. Os tibetanos acampados na capital foram massacrados - nesse período, estima-se que mais de 86 mil tibetanos tenham sido mortos na região central de seu país.

Dezenas de milhares deixaram o Tibete logo após o Dalai Lama. Muitos morreram no caminho, ao cruzar o Himalaia, e aqueles que conseguiram chegar à Índia estavam feridos, doentes e famintos.

Um mês depois de deixar seu palácio, o Dalai Lama chegou à Índia. Tinha 24 anos. Hoje, aos 69, ainda não retornou ao seu país. ele e Thubten Khetsun, o tibetano que se refugiou nos Estados Unidos, ainda aguardam a hora em que verão novamente o Potala e o Norbulingka, emoldurados pelas montanhas do Himalaia.

Fim.



Referências Bibliográficas

Livros

Sete anos no tiber, de Heinrich Harrer, ed. L&PM, 1999.

Pelos Caminhos do Tibete - Revelações na terra do Dalai Lama, de Airton Ortiz, ed. Record, 2001.

Minha Terra e Meu Povo - A Autobiografia de Sua Santidade, o Dalai Lama, ed. Sextante, 2001.

Filmes
Kundun, de Martin Scorcese, EUA, 1997.

Sete Anos no Tibete, de Jean-Jacques Annaud, EUA, 1997.

Site
www.tibet.com, Governo do Tibete no Exílio



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