sexta-feira, 18 de novembro de 2016

O bê-a-bá da Fé - Parte 4

(A religiosidade brasileira é uma luta, que veremos no final desta matéria, iniciada em 1549. E, apesar de parecer irrelevante esse tipo de discussão no Brasil, isso é motivo de muitos problemas nas vidas de algumas pessoas, ficando em pauta desde o veto da governadora Rosinha Matheus-RJ em 2005, estabelecendo o ensino religioso confessional. Acima, a primeira parte da série Fé na Educação exibido pelo canal privado Globo News, em 2012.)

Esteve em curso, especialmente no estado do Rio de Janeiro, a discussão sobre o ensino religioso nas escolas, iniciado em 2000 pelo então governador Anthony Garotinho.


(Participantes de uma onda evangélica que se propagou pelo mundo desde 1994, Rosinha Matheus e Anthony Garotinho pregavam sua fé em todo Rio de Janeiro, acreditando que isso mudaria o rumo da violência do estado. Infelizmente, eles mesmos foram tragados, e a fé de ambos não foi o suficiente para sustentar tudo o que pregavam... Acima, matéria do jornal Globo News, de 18 de novembro de 2016.)

No início de março de 2005, a Assembléia Legislativa carioca manteve o veto da governadora Rosinha Matheus (PMDB), esposa de Garotinho que assumiu o governo do estado, ao projeto de lei que instituía o ensino inter-religioso (que aborda igualmente todos os credos e religiões) nas escolas públicas do estado do Rio. O problema, foi que a governadora queria que cada religião fosse ensinada em salas separadas e com professores formados ou com experiência na disciplina teológica própria para o aluno confessional.  O que foi tido como um enorme retrocesso, já que este veto assim estabelecia: "O ensino religioso nas escolas públicas do Rio de Janeiro deve ser ministrado por professores que professem a mesma teologia religiosa de seus alunos em sala de aula." - numa tentativa de deter as crescentes ondas de violência criminal e discriminação religiosa iniciada no Brasil na época, por evangélicos que estavam ascendendo os estratos sociais.

(Conflitos religiosos tem atualmente, sido despertados. A França tem sofrido com os limites da religião há 10 anos antes da ocorrência acima. O uso confessional religioso na França é um assunto complicado desde o reinado de Luis Felipe I (1773-1880) que exigiu, por medo de sua deposição, que todas as religiões e sociedades secretas expusessem suas reais intenções para com a Monarquia. Hoje, esse medo político ainda reverbera na França, onde o ensino e apresentação confessional de uma religião é entendida como uma violação aos direitos humanos. A situação saiu do controle em 2010 por conta dos atentados de 11 de setembro nos EUA e Inglaterra, startartando o alerta mundial. O uso de véu, burka ou likab, que cobrem o rosto da mulher, dificultando a identificação de um possível terrorista; desde 2005, é palco de discussão, mas o uso do likab e a burka, é proibido em locais públicos e de massa. Acima, trecho do jornal Bom Dia Brasil, da rede pública Globo, de 2011.)

Em 2005, em edital, foi proclamado que haveria no estado do Rio de Janeiro concursos para professores lecionarem em escolas públicas com o objetivo do ensino religioso confessional. Houve um embargo do Ministério Jurídico, pois a prerrogativa de abrir concursos públicos pedagógicos deve ser deferido pelo Ministro do Executivo, o que não havia acontecido. A discussão foi se protelando e caiu no esquecimento... 

O que vigora nos colégios cariocas e em todo o Brasil é a implantação da Lei de Diretrizes e Bases, atualizada em 2008 que promulga: 

"Art.11 - A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa.

"Parágrafo 1º - O ensino Religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação."
Constituição da República Federativa do Brasil,
Lei Fundamental, Título VIII. 

Como ficou?

Hoje, no Brasil, as escolas públicas não possuem disciplinas específicas teológicas em sua grade pedagógica. O que ficou sendo adotado, apesar da Lei citada acima, é que as disciplinas de Filosofia, Sociologia e Educação Cívica abordem moderadamente esse assunto. 

Acreditar que o Brasil não sofre com discriminação religiosa é uma tolice... Sim, apesar do Brasil desfraldar a bandeira de liberdade de expressão, e, sim, até possuirmos muitas liberdades de fundo cultural que surpreende estrangeiros do mundo inteiro, a identidade religiosa individual ainda é fruto de medos, preconceitos e constrangimentos. 

(A pressão que perdura desde o século 19 na França, e a discriminação em escolas e na vida pública na cidade de Paris, só tem piorado a convivência pacífica entre seus cidadãos. Acima, matéria do Jornal Nacional exibido em 17 de outubro de 2015.)

Toda a discussão traz à tona o papel da escola na formação religiosa das crianças. 

Para a professora e mestranda Milena Gusmão, existem diferenças fundamentais entre a educação religiosa da família e a das escolas. 

"É aceitável que os pais queiram passar seus valores para o filho. Se praticam uma religião de forma atuante, a criança assimilará a crença naturalmente."
Prof. Milena Gusmão

Porém, nas escolas o ensino deve ser inter-religioso. Todos os credos devem ser apresentados de modo equilibrado a fim de que o aluno desenvolva a tolerância e o entendimento do "algo" em comum que une todas as crenças: que é o desenvolvimento e a melhoria da integridade e caráter do ser humano.

A alteração da Lei feita no início desta matéria burlaria essa liberdade.

O papel da escola é despertar a autonomia e a consciência do aluno para essa questão. 

Ao contrário de reforçar as diferenças, os colégios deveriam promover o diálogo. Afinal, no bê-a-bá da fé, o exemplo é muito mais forte do que o discurso ou a repreensão.

Os caminhos espirituais que a criança seguirá no futuro estão fora do alcance de pais, líderes religiosos ou educadores. Mas uma coisa é certa: a semente da religiosidade, se bem plantada e cuidada, estará sempre lá!

"O ensino religioso é  base para preparar crianças e jovens para uma vida cheia de fé e amor ao próximo."
Helena P. Blavatski,
escritora, criadora do sistema Teosófico e da Sociedade Teosófica (1831-1891).


Debate Teológico

Saiba como várias religiões formam suas crianças. 

Adventistas - Há lições bíblicas para cada faixa etária, que devem se reestudadas em casa diariamente e nas escola sabatinas. Além disso, a igreja oferece cursos cristãos durante as férias, conjuntos musicais e grupos de atividades, como os desbravadores. 

Budismo - A iniciação budista não tem idade, parte da vontade da criança. No japão e na China, são mais comuns as escolas de ensino confessional e ensino nos templos. No Brasil, como a religião ainda é recente, são poucos os templos que oferecem essa estrutura. Há cursos e retiros dos quais as crianças participam, mas nada voltado apenas para elas. 

Catolicismo - A partir dos 7 anos, as crianças começam a compartilhar das aulas de catequese, preparação para  a Primeira Comunhão, na qual receberão o corpo e o sangue de Cristo. Antes de comungar, os pequenos também se confessam pela primeira vez. Até então, eles não têm acesso a esses dois sacramentos, mas participam das missas, cantam, fazem suas orações.


(A experiência da prof. Alessandra Ribeiro de Jesus Mendes, doutoranda da Unesp, explicando a necessidade da diversidade religiosa nas centros educacionais, de 2014.)

Espiritismo - As casas espíritas seguem diferentes métodos. No Centro Espírita Antônio Cruz, em Vitória da Conquista, enquanto os pais se integram à palestra e aos passes, crianças de 4 a 12 anos participam da escola de Moral Cristã. Lá, aprendem não somente os fundamentos do Espiritismo e os ensinamentos de Jesus, mas também recebem uma formação moral, por meio de cantos, orações, pintura, música e teatro.

Hare Krishna - A religião é transmitida no lar ou em escolas chamadas de gurukula, onde as crianças a partir dos 5 anos, aprendem as disciplinas do ensino regular, agricultura, sânscrito, artes e a filosofia da religião. No Brasil, a única escola védica é a Nova Gokula, em Pindamonhangaba, no interior de São Paulo.

Islamismo - As primeiras palavras que uma criança muçulmana ouve, ao nascer, são orações recitadas por seus pais, que dependendo se a vertente islâmica for conservadora, poderá até ser recitada em libanês ou árabe, conforme a nacionalidade dos pais. A formação religiosa se dá em escolas de ensino confessional islâmico e, nas mesquitas, em grupos de estudos do Corão para crianças, cursos de férias e cursos de fim de semana. 


(A briga religiosa entre o Pr. Silas Malafaia e o jornalista Boechat rendeu nas redes sociais... Acima, Nando Moura deixando sua opinião religiosa em 2015. A necessidade e função de haver o ensino religioso laico em tenra idade  nas escolas é, exatamente, para evitar situações como essas: partidarismos desnecessários, defesas e ataques que promovam violência, e o desrespeito ao público ao definir a minha visão do "certo".)

Judaísmo - Desde cedo, as crianças são acostumadas a respeitar o Shabat e os rituais religiosos. Os pais judeus tentam educar seus filhos primeiro pela vivência, na rotina diária doméstica. A garotada estuda, geralmente, em escolas de ensino confessional, onde aprende a cultura e a religião judaicas. Aos 13 anos, para os meninos, e aos 12 para as meninas, acredita-se que tenham conquistado a primeira maturidade de sua Alma, sendo, então, chamados para ler a Torá em público pela primeira vez, mas sem tocá-la. 

Umbanda - Desde cedo, as crianças participam das reuniões, mas não as acompanham por inteiro: compõem a curimba (local do terreiro onde ficam os instrumentos de percussão e onde são feitos os cantos), recebem passes num momento exclusivo, ajudam a tirar os bancos e a distribuir frutas oferecidas aos orixás e aos participantes. Nos momentos mais sérios das reuniões, ficam numa sala à parte, com jogos, brincadeiras e dinâmicas de grupo.  

"Ensina a criança o caminho que deve andar, e ainda quando for velho não se desviará dele." 
Livro dos Provérbios do Rei Salomão 22:6


As Leis Religiosas do Brasil

1549 - Trazidos pelo governador geral Tomé de Souza, chegam ao Brasil seis missionários jesuítas liderados por Manuel da Nóbrega. Em Salvador, fundam o colégio da Companhia de Jesus, a primeira de centenas de escolas públicas e gratuitas espalhadas pelo Brasil. Originalmente, essas instituições seriam para os indígenas, mas eles frequentavam apenas as unidades de fazenda, onde serviam de mão-de-obras para os jesuítas. Os colonos reivindicaram as escolas para educar também seus filhos e se tornaram seus usuários exclusivos.

1759 - Os jesuítas são expulsos de Portugal e dos territórios pelo Marquês de Pombal. O ensino público passa às mãos de outros setores da Igreja Católica.

1824 - Começa a vigorar a primeira Constituição do País: "Constituição Política do Império do Brazil" - outorgada por D. Pedro I no dia 25 de março de 1824. A carta estabelece que a religião Católica Apostólica Romana continuará a ser a Religião do Império.

1890 - O Decreto 119 - Assinado pelo presidente Manoel Deodoro da Fonseca, proíbe a intervenção da autoridade federal e dos Estados federados em matéria religiosa e consagra a pela liberdade de cultos.

1891 - Começa a vigorar a primeira Constituição republicana que define a separação entre o Estado e quaisquer religiões ou cultos e estabelece que "será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos". Também se proclama que todas as religiões são aceitas no Brasil, e podem praticar sua crença e seu culto livre e abertamente.

1931 - Decreto de Getúlio Vargas - reintroduz o ensino religioso nas escolas públicas de caráter facultativo. Em resposta, foi lançada a Coligação Nacional Pró-Estado Leigo, composta por representantes de todas as religiões, além de intelectuais, como a poetisa Cecília Meireles.

1934 - É promulgada uma nova Constituição, cujo artigo 153 define: "O ensino religioso será de frequência facultativa e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis, e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais".

1946 - A Constituição que passa a valer em 18 de setembro diz: "O ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável". 

1961 - A primeira Lei de Diretrizes e Bases (LDB 4024/61) propõe em seu artigo 97: "O ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, é de matrícula facultativa, e será ministrado sem ônus para os poderes públicos, de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável. Parágrafo 1º - A formação de classe para o ensino religioso independe de número mínimo de alunos. Parágrafo 2º - O registro dos professores de ensino religioso será realizado perante a autoridade religiosa respectiva".

1967 - A nova Constituição Federal diz: "O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas oficiais de grau primário e médio".

1969 - A emenda constitucional número 1/1969 mantém a mesma redação da Constituição de 1967.

1971 - Na segunda LDB (5692/71) consta: "Art.7º - Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de 1º 2º graus, observando quanto à primeira o disposto no Decreto-Lei nº 369, de 12 de setembro de 1969. Parágrafo Único: O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais dos estabelecimentos oficiais de 1º e 2º graus".

1988 - A nova Constituição diz no artigo 210, parágrafo 1º: "O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental". O artigo 5 define: "É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias". No artigo 19, consta: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: 1 - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalva, na forma da lei, a colaboração de interesse público; 2 - recusar fé aos documentos públicos; 3 - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.

1996 - O texto da Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9394/96), de dezembro de 1996, definia: "O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter: 1 - Confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou 2 - Interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa".

1997 - Em julho passa a vigorar uma nova redação do artigo 33 da LDB 9394/96 (a lei nº 9.475): "O ensino religioso de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Parágrafo 1º - Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. Parágrafo 2º - Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso".

2009 - Aprovação pelo Congresso Nacional do Acordo Brasil-Santa Sé, assinado pelo Executivo em novembro de 2008. O acordo cria novo dispositivo, discordante da LDB em vigor: 

"Art. 11 - A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa. Parágrafo 1º O ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultual religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação".


Fim.:.




Referências Bibliográficas

Oração de Gente Pequena, de padre Zeca, ed. Paulus, 2003.

Catequese Hoje, ed. Paulus, de 2003.

Ensino Religioso e Formação do Ser Político, de Tarcizo Gonçalves Filho, ed. Vozes, 1998.

As Leis Brasileiras e o Ensino Religioso nas Escolas Públicas, fontes UMESP, USP, MPD, FAPESP, de 2015.

sábado, 12 de novembro de 2016

Do Berço ao Túmulo: Rituais Eternos... - Parte 2

(Um dos filmes mais legais que eu já assisti, baseado em fatos reais. Conta como foi difícil para as mulheres judias saírem do anonimato de suas sinagogas e cultura, e serem mulheres independentes e profissionais. Esse filme ainda conta o drama de uma mulher que desejava ser uma Rabina, coisa comum hoje em dia, mas ainda considerado um tabu. Acima, cenas do filme Yentl com a participação maravilhosa de Barbra Streinsand, com uma trilha musical marcante e cativante, de 1983.) 

Muitas dessas cerimônias citadas na matéria anterior, porém, são restritas aos homens, resquício do tempo em que uma sociedade patriarcal ditava os costumes. 

Na verdade, a lei judaica isenta as mulheres da observância de alguns mandamentos, em especial aqueles ligados à sinagoga. Por isso, os rituais mais propalados acabam sendo os masculinos. 

Contudo, isenção não é proibição.

(A mulher sempre foi um elemento que buscou a espiritualidade de seu povo, independentemente, da crença ou cultura. A mulher judia não era diferente: Ela podia não saber ler, mas recitava de cor muitos trechos da Torá, pois ela era o primeiro contato religioso da família, e todo o ensinamento circulava em torno dela e de seus exemplos. Acima, um dos momentos mais bonitos e marcantes da Bíblia, onde mostra a história de Ana, mãe do grande profeta Samuel, que buscava a presença de Iavé, e durante uma de suas visitas ao Tabernáculo ganhou uma profecia por sua insistência espiritual, em 1º Livro do Profeta Samuel 1: 1-21.)

A mulher, ainda, que isenta, pode tomar para si, voluntariamente, tais obrigações. Isso a elevaria à mesma categoria dos homens, tornando possível a participação igualitária na sinagoga.

Segundo a tradição, o espaço reservado às mulheres é a casa, sem que essa atribuição tenha qualquer caráter pejorativo. Afinal, há importantes rituais domésticos no Judaísmo, como o Shabat, o dia do descanso semanal que começa no anoitecer da sexta-feira.


(Numa primeira vista, a vida da mulher judia é cheia de obrigações e pode parecer opressiva, mas não é bem assim: Cada data ou celebração é um ritual, que só a mulher pode conduzir. Isso é Cabala: A mulher tem a energia para manipular o físico; o homem tem a energia para manipular o mental. Por isso, o homem judeu se isenta de tocar na alimentação ou utensílios domésticos de um lar judeu. Acima, episódio do canal Judaísmo da Unidade para Mulheres, de 2014.) 

Nele, a participação feminina é essencial. 

Por estar tradicionalmente ligada ao cuidado da casa e dos filhos, a mulher não precisa se prender a horários e objetos, nem usar algo para marcar sua espiritualidade. 

Diferenças à parte, enquanto os ritos revigoram a fé dos praticantes, o próprio Judaísmo se renova na vivência de cada fiel. 

Depois do memorável dia em que se tornou adulto diante da comunidade, o prof. Joseph Goldberg, hoje com 66 anos, passou por outras várias cerimônias: casou-se, teve filhos e netos, enterrou a mãe. 

(Acima, Dna. Nadine, esposa do professor Goldberg, cuidando de seu invejável e admirável jardim.)

Esses rituais materializam ideias e concretizam emoções, ou seja, traduzem a religião para a prática. É na caminhada espiritual de Nadine e Joseph, e dos outros milhões de judeus, que a história permanece viva. 


A Inspiração do Nome

Quando uma criança nasce, os judeus cumprimentam os pais com desejos de Mazal Tov, que quer dizer "Boa Sorte". 

A palavra mazal refere-se às constelações do Zodíaco, algo parecido ao que o escritor e teósofo J.R.R. Tolkien imprimiu em sua obra com o diálogo entre seus personagens: "Uma estrela brilhou no momento de nosso encontro", em O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel.

Mas que estrela seria essa, e qual a importância da mesma na cultura judaica? Isso são assuntos velados, que nenhum judeu ou cabalista conversará abertamente. Esse estudo é um tipo de astrologia cabalista, que o Rabino da sinagoga local efetuará as devidas pesquisas para identificar as energias dessa "chegada" para a família e comunidade judaica.

"Esperamos que um bom movimento lá nos céus traga sorte à criança."
Prof. Joseph Goldberg


(Motivo de grande controvérsia entre estudiosos, os textos dos evangelhos bíblicos não tinham o interesse de identificar a estrela no momento do nascimento de Jesus, mas sim, registrar um hábito exercido pelos judeus, que mostrava a energia no dia que Jesus nasceu foi benéfica e pontuada no céu, como deve ser. Isso é Cabala: "Os Céus declaram as obras de Suas Mãos", Salmo 19, confirmando a vontade divina pelo nascimento da criança.)

No nascimento de cada um de seus filhos, o prof. Goldberg foi à sinagoga, durante a leitura da Torá, declarar sua felicidade pelo presente recebido dos céus e manifestar, perante a comunidade, o compromisso de transmitir aos filhos a tradição judaica. 

Nessa cerimônia, chamada Simchat Bat, ocorre a revelação do nome da criança, mantido até então em segredo pelos pais. 

Apenas o Prof. Goldberg e sua a esposa Nadine, sabiam, junto com seu Rabi como cada filho iria se chamar e mais ninguém. 

Todo nome, para um judeu é inspirado por um anjo, é descritivo, profético e revelador, porque encerra a própria essência da alma, segundo a tradição do Talmude. 

(Um dos momentos mais importantes de uma família judia: a escolha do nome de seus filhos. Um verdadeiro judeu irá até sua sinagoga local e o Rabino fará um estudo numerológico, cabalístico, astrológico e familiar para efetuar precisamente essa escolha. Após orações e jejuns, os pais receberão a indicação divina para o nome que é a Alma da própria criança, que agora, será chamada por Iavé após sua morte, para que ela siga sua voz no momento de sua passagem.) 

Alma, em hebraico é neschmá, cujas letras centrais formam a palavra shém, que significa nome. 

"Acreditamos na origem divina do mundo por meio da Palavra."
Dona Nadine, esposa do prof. Goldberg 

Primeiro vem o Verbo, é Ele quem Cria.

Para não deixar Deus em segundo plano, primeiro o prof. Goldberg "subiu à Torá", que quer dizer, orou a Iavé e compartilhou com Ele o nome de seus filhos, dando o privilégio de Adonai ser o primeiro a saber antes da comunidade.


O Pacto de Abraão

Ao dar a luz seu primeiro filho, Dna. Nadine perguntou:

"É um menino? Meu pai vai ficar contente."

De fato, o avô de Judá Goldberg ficou satisfeito e também orgulhoso por ter sido escolhido para sândec, uma espécie de padrinho no Brit Milah - pacto de circuncisão, em hebraico.


(Circuncisão de Judá Goldberg na presença de seu avô Avraham Zadac.)

Levar um menino ao Brit é sentir-se um pouco como o patriarca Abraão: o pai judeu revive a aliança com o Criador ao declarar numa obediente profissão de fé: "Eu acredito, reconheço e entrego".

O Brit Milah é uma declaração de Judaísmo marcada sobre o pênis, o órgão reprodutor das gerações futuras; é uma marca, feita na carne, de adesão à fé gravada na alma dos judeus.


(A circuncisão nada mais é do que um pacto de sangue entre Deus e seu seguidor. Acima, como essa cirurgia ocorre e suas aplicações.)

O ritual se realiza no oitavo dia do nascimento, tempo estabelecido por Deus a Abraão para que o patriarca circundasse seu filho Isaac:

"Abraão circuncidou a seu filho Isaque, quando este era de oito dias, segundo Deus lhe havia ordenado.

"Com efeito, será circuncidado o nascido em tua casa, e o comprado por teu dinheiro; a minha aliança estará na vossa carne e será aliança perpétua. A minha aliança, porém, estabelecê-la-ei com Isaque, o qual Sara te dará à luz, neste mesmo tempo, daqui um ano.

"Tinha Abraão noventa e nove anos de idade, quando foi circuncidado na carne de seu prepúcio

"Tinha Abraão cem anos, quando lhe nasceu Isaque, seu filho."
Livro de Gênesis 21:4,5 e 17: 13, 21, 24

A Circuncisão só pode ser efetuada na presença de um Mohel, a autoridade religiosa perita na retirada do prepúcio, e só será adiada se ele, por razões de saúde da criança, indique a ocorrência. 

A circuncisão é a marca da singularidade judaica, em que a força e o peso da história ficam evidentes.

Baruch Hah-Bah, (trad. Bem-vindo seja o que chega!), proclama em alta voz o mohel ao receber o menino e colocá-lo sobre a cadeira do profeta Elias, cuja presença é invocada para testemunhar que os filhos de Israel estão cumprindo o pacto de Abraão. 

Em seguida, o mohel entrega o filho ao pai, que o deita nos braços do sândec, a quem cabe a tarefa de segurar e acalmar o menino. 

A operação é, então, realizada.

O pai da criança recita uma bênção, agradecendo a Deus pelo ingresso do filho no pacto judaico, e todos pedem em voz alta que a criança chegue à Torá, à Chupá (o casamento) e às boas obras. 

O mohel proclama, então, o nome do menino. Somente nesse momento a família e toda a comunidade judaica tem conhecimento do nome escolhido da criança que foi mantido em sigiloso segredo por meses...

O clima é de comemoração!

(Um autêntico Brit Milah...)

"Aproveitamos que o céu está em festa para fazer nossos pedidos pessoais."
Prof. Goldberg

Os lábios da criança são molhados com um pouquinho de vinho e ele se acalma. 

E a cerimônia se encerra. 



Continua...



Aranel Ithil Dior. Tecnologia do Blogger.

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