Povos que habitaram boa parte da Europa na Antiguidade, os celtas legaram uma religião que louvava a natureza, a tênue conexão entre este mundo e o Além e que valorizava a participação feminina nos rituais.
Mais uma vez, o ciclo que governa todas as coisas se fechara, e o outro dava lugar ao inverno. Nas colinas, fogueiras se acendiam devagar, sob a orientação sábia dos druidas, os sacerdotes celtas.
Pessoas e animais buscavam abrigo em cabanas e celeiros. Naquela noite, as fronteiras tênues entre este mundo e o Além estavam ainda mais esgarçadas, e não seria nada sensato ignorar os sinais que a natureza mostrava. Por via das dúvidas, sacrifícios aos deuses podiam manter a escuridão a distância, até que o sol voltasse a brilhar com mais força, dali a vários meses.
Essa capacidade de identificar as conexões entre o mundo natural e o espiritual marcava a religião dos amigos celtas. Embora pouco se saiba sobre seus deuses e cultos, o fato é que eles deixaram sua marca sobre uma extensa região do continuente europeu. Mesmo quando abraçaram o Cristianismo, os celtas mantiveram uma identidade religiosa própria e tão vigorosa que ajudou a salvar sua nova fé da decadência.
Não há muitas informações a respeito das origens da religão que eles praticavam, em parte porque nunca formaram um império unificado - eram, na verdade, um agrupamento de muitas tribos. O que unia os celtas, originalmente, era a língua, um dialeto do tronco indo-europeu ao qual também pertenciam o latim, o grego e os idiomas germânicos (ancestrais do inglês e do alemão de hoje).
Por volta do ano 700 a.C., as tribos celtas deixaram seu lar ancestral na Áustria e no sul da Alemanha. Invadiram e colonizaram a França, a Inglaterra, a Irlanda e a Espanha. No Oriente, até um pedaço da Turquia virou domínio daquelas tribos. Os princiapais centros de sua cultura, porém, tornaram-se a Gália (atual França) e as Ilhas Britânicas.
Os vários povos celtas em sua maioria, eram analfabetos e, por isso, os principais relatos sobre seu modo de vida vêm dos gregos e dos romanos, que lutaram ou comercializaram com eles, ou dos missionários cristãos que os evangelizaram. Segundo esses relatos, os celtas eram agricultores e artesãos habilidosos, mas também guerreiros temíveis, que prezavam a coragem na batalha acima de tudo.
O celta típico valorizava a generosidade e a beleza - a dos objetos de arte, a das canções dos bardos e, principalmente, a da natureza.
Segundo os ensinamentos dos druidas, tudo no mundo possuía vida - de humanos a árvores, de animais a um rio, de lugares a idéias. Sendo assim, tudo era sagrado. Não admira que, com essa disposição em ver divindade em tudo, seja difícil apontar qual era o principal conjunto de deuses desse povo. Não há uma homogeneidade no que se costuma denominar de mundo céultico. é possível falar de divindades locais e de semelhanças entre elas, mas não generalizar que elas fossem iguais.
Mesmo assim, havia alguns deuses em comum às várias tribos celtas: Lugh ou Lugus, um jovem deus guerreiro ligado ao Sol; Ogma ou Ogmios, senhor da literatura e da poesia; e várias versões de uma Grande Deusa, mãe ou esposa dos imortais, que comandava os mistérios da morte e da fertilidade da terra. A vida desses seres era tão movimentanda quanto a de qualquer mortal, mas uma história recorrente é o combate dos deuses contra criaturas ainda mais antigas, gigantes e mosntros que habitavam o fundo do mar e representavam o caos primordial.
Foi só nos últimos séculos de sua história independente que os celtas começaram a representar seus deuses em forma humana: a associação das divindades com as forças da natureza revelava-se na mistura delas com figuras de animais sagrados.
Os jovens deuses guerreiros eram como javalis, ou tinham orelhas e chifres de cervo. As deusas associavam-se a ursos, cavalos ou corvos. O nome da deusa irlandesa Morrígahan, por exemplo, pode tanto ser traduzido como "A Grande Rainha" quanto como "Corvo da Batalha". Às vezes, ela aparecia na forma de um corvo e, em outras, na de um lobo cinzento. Como esses animais, conhecidos por devorar os mortos no campo de batalha, Morríghan apreciava a guerra - mas também era descrita como um donzela formosa, capaz de iniciar os homens nos mistérios da morte e do renascimento.
As tribos celtas não apreciavam templos feitos por mãos humanas ou rituais pomposos. Bosques eram o melhor lugar para adorar os deuses, e rios, fontes e lagoas viviam recebendo oferendas de armas e jóias. Os pântanos, por estranho que pareça, também tinham seu lado sagrado, por representar a ligação entre a terra, que proporcionva a s colheitas e a água, que para os celtas era o caminho que conduzia ao Outro Mundo.
Sacrifícios de animais, como bois e porcos, eram parte importante desses rituais, mas certas ocasiões também incluíam a matança de pessoas. Eram sacrificados os criminosos e os prisioneiros de guerra, mas esses rituais ficavam restritos a situações cruciais, de grande tensão.
Parece que a cabeça das pessoas oferecidas aos deuses ganhava um significado mágico: na França, havia um antigo portal de pedra cheio de nichos onde eram colocados crânios humanos. Na Irlanda, quando a terra se tornava estéril, o rei também podia ser sacrificado, já que se considerava que a fertilidade do solo era de sua responsabilidade, contando-lhe sua cabeça e oferecendo-a como petição para novas e boas colheitas.
Continua...
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