sexta-feira, 2 de setembro de 2016

O Mundo Mágico das Florestas - Parte 3

(Êta, saudade das minhas férias em Macaúbas... Todas as nossas férias escolares eram passadas por aqui, Macaúbas-BA, quando tudo ali era só mato e lendas... A gente fugia dos rodamoinhos de vento, dos cavalo-do-cão e, claro, dos curupiras: Seres estranhos, invisíveis às vezes, apesar que meus coleguinhas e primos juravam de pé-junto que já tinham o visto... Um ser bizarro que te encontra e te perde na floresta! Acima, cenas de Eu Juro Que Vi: A Lenda do Curupira - Documentário distribuído pelo depto. História-UNESP para escolas públicas, de 2011.)

Na floresta, muitos são os perigos sobrenaturais...

Entre os cintas-larga de Rondônia, por exemplo, teme-se o Pavu, uma entidade que mata os incautos que encontra no mato. 

A antropóloga e professora Carmem Junqueira conta que o Pavu tem o dom de se transformar em algo atraente para o índio (pode ser um parente querido que já morreu ou uma caça). 

(O Pavu, tema do festeiro Edu Rossi, no desfile anual de Paratins, em Manaus, Amazonas.)

O índio que olhar para ele pega febre ou morre!

Por isso, os índios não costumam ir sozinhos para a mata:

"Muito menos à noite...!"
Carmem Junqueira

Segundo os kamayurá, um indígena que já morreu e não foi para o mundo dos mortos, também pode se tornar uma entidade maligna.

(O novo remake do Sítio do Pica-pau Amarelo, todo mundo é politicamente correto: Pedrinho respeita a Narizinho, a Emília não é tão peste, todo mundo é assustadoramente magro, e as guloseimas de tia Anastácia, ah..., perderam a graça... Mas, enfim, novos tempos, novas abordagens... Acima, a história do Saci, uma entidade que não é nem maligna nem boazinha, ela quer apenas "causar". O Saci é um exu-mirim, um elementar em transição, que ainda não decidiu exatamente se quer ajudar ou prejudicar a evolução humana. Na cultura africana, eles habitam as florestas e podem tanto ajudar como prejudicar o caçador. Cenas de O Sítio do Pica-Pau Amarelo, ep. O Saci, de 2009.)

Daí, quando morre um índio, os indígenas executam cuidadosos rituais para que a alma encontre, com segurança, a Aldeia Das Almas ou o "mundo superior na luz da divina providência".

Do nascimento à morte - e até depois dela - o índio brasileiro participa de diversos rituais. O primeiro, importantíssimo, é a adoção do nome. 

Em geral, é o xamã que dá o nome à criança, depois de o procurar, em transe, pelo mundo dos mortos. 

(Na teologia indígena americana, o nome é um Daimon ou Totem, é uma representação da força e dignidade de uma entidade, tão poderosa que anima a sua vida e te protegerá em qualquer circunstância. A priori, essa também seria a explicação para que em rituais de iniciação o nome do adepto seja mudado. O seu nome "chama" a entidade-força à ter vida em você mesmo! - Acima, cenas da animação Irmão Urso, de 2003.)

(Sobre isso, escreveu Philip Pullman, o qual fez uma pesquisa interessante dos mitos gregos e egípcios para compor seus personagens e história. Os livros são maravilhosos e instigantes; o filme, infelizmente, e por causa da crise americana da época, não embalou os outros capítulos da série... Acima, cenas do filme A Bússola de Ouro, de 2007.)

Assim, a criança que recebe esse "nome-alma" é, também, uma reencarnação desse ancestral. 

Os índios que se convertiam para o Cristianismo ficavam muito surpresos quando o padre, na cerimônia de batismo, perguntava o nome aos pais indígenas da criança, e , eles retrucavam:

"Então o senhor não sabe?!?"

Ao longo dos anos, na rotina cotidiana de uma tribo, outros ritos se sucedem, muitos deles relacionados à passagem de uma fase a outra da vida, como a reclusão que as meninas fazem na puberdade (mencionado na postagem anterior), a iniciação dos meninos no grupo dos homens, as cerimônias funerárias ou mesmo o Kuarup.

(Ritual do Kuarup em homenagem aos mortos, uma festa típica no Xingu, 2011.)

Realizado pelos povos do Xingu, o Kuarup pode ser compreendido como um ritual de despedida dos mortos.

Durante a festa, os mortos - representados por toras de madeira enfeitadas - são pranteados pela comunidade, mas também homenageados por cantos, danças e lutas. 

(A teologia judaica também mostra algo parecido: O rei devia possuir um formato parecido com o faraó, afinal, Moisés aprendeu como deveria ser uma monarquia: O rei era um tipo de guia espiritual, mas não possuía prerrogativas para receber palavras ou mandamentos diretos de Deus; isso era uma atribuição do Sumo-Sacerdote ou de algum profeta, elemento espiritual surgido entre o povo, contudo não reconhecido entre o clero. Acima, cenas do filme Rei Davi, de 1985, sobre a passagem de 2 Samuel 6:12-15.)

Nos ritos de passagem, bem como em cerimônias relacionadas ao plantio e à colheita, pode entrar em cena outra liderança religiosa: o "sacerdote", cuja função pode ser assumida também pelo pajé, de acordo com a tribo.

O Sacerdote é o tipo de especialista que domina o conhecimento esotérico do sagrado, mas não tem, necessariamente, contato direto com os espíritos, o que seria prerrogativa do pajé. 

Em vários grupos indígenas, é aquele que entoa os cantos sagrados.



Continua...



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